BRENDA GOODMAN
DA CNN
Medicamentos populares GLP-1 aprovados para perda de peso, diabetes e doenças cardíacas podem ter potencial inexplorado para tratar transtornos por uso de substâncias, psicose, infecções, câncer e demência, revela um novo estudo abrangente publicado na segunda-feira (20) na revista Nature Medicine.
A pesquisa também aponta para riscos importantes e talvez subestimados desses medicamentos. Esses riscos envolveram principalmente o sistema digestivo e incluíram náusea e vômito, dor estomacal, azia e gastroparesia, ou paralisia do estômago.
Além do sistema digestivo, pessoas que tomaram medicamentos GLP-1 também apresentaram maior probabilidade de serem diagnosticadas com problemas nos ossos e articulações, como artrite e tendinite, em comparação com pessoas tomando outros medicamentos para controlar o açúcar no sangue.
De 175 diferentes resultados incluídos no estudo, os pesquisadores descobriram que pessoas que tomaram medicamentos GLP-1 tiveram riscos menores em 42 diferentes desfechos de saúde e riscos maiores em 19. Algumas das maiores reduções de risco foram para choque, pneumonia por aspiração, insuficiência hepática, insuficiência pulmonar e parada cardíaca.
Embora tenham encontrado mais benefícios associados aos medicamentos GLP-1 do que riscos, o autor do estudo Dr. Ziyad Al-Aly, que é chefe de pesquisa e desenvolvimento no VA St. Louis Health Care System, diz que as pessoas não deveriam interpretar isso como um sinal verde incondicional.
“É difícil fazer uma recomendação geral, porque os efeitos colaterais são reais”, afirma Al-Aly. “Acho que as pessoas devem conversar com seus profissionais, médico ou provedor de saúde e fazer sua própria análise individualizada de risco-benefício”, afirmou.
Embora as pessoas tenham compartilhado histórias pessoais sobre os efeitos colaterais às vezes surpreendentes dos medicamentos, como gravidez, e estudos individuais tenham sugerido novos benefícios e riscos, houve poucos estudos capazes de fazer uma análise abrangente de como esses medicamentos, que incluem Ozempic, Wegovy e Mounjaro, podem alterar a saúde geral de uma pessoa.
O estudo é uma das primeiras visões panorâmicas dos benefícios e riscos desses novos medicamentos, que rapidamente causaram impacto nos cuidados de saúde, cobertura de seguros, indústria alimentícia e até na economia de um país inteiro — a Dinamarca, onde a Novo Nordisk, fabricante do Ozempic e Wegovy, está sediada.
Para a investigação, uma equipe liderada por Al-Aly analisou os registros de quase 2 milhões de pessoas com diabetes que foram tratadas pela Administração de Saúde dos Veteranos por uma média de quase quatro anos entre outubro de 2017 e o final de dezembro de 2023.
O estudo comparou cerca de 216.000 pessoas que receberam prescrição de medicamentos GLP-1 com pessoas que receberam prescrição de três outros tipos de medicamentos para baixar o açúcar no sangue, bem como aqueles que se inscreveram no sistema com diabetes e continuaram tomando os medicamentos que já haviam sido prescritos sem alterações em sua terapia, o que significa que não começaram um novo medicamento durante esse período. No total, o estudo utilizou os históricos médicos de 2,4 milhões de pessoas.
Al-Aly usou esses registros para construir o que ele chama de “um atlas de associação”, ou uma imagem abrangente dos riscos e benefícios dos medicamentos em todo o corpo.
Outros especialistas afirmam que o estudo foi útil para pensar sobre os medicamentos em uma escala maior.
“É um estudo muito interessante”, comenta Scott Butsch, diretor de medicina da obesidade na Cleveland Clinic em Ohio, que não estava envolvido na pesquisa. “Este artigo amplia nosso conhecimento atual sobre a eficácia desta classe de medicamentos.”
Pesando benefícios e riscos
Os maiores aumentos de risco foram observados para náusea e vômito, cálculos renais, doença do refluxo gastroesofágico ou DRGE, distúrbios do sono e gastroenterite não infecciosa, que é uma inflamação do trato digestivo que pode causar náusea, vômito, diarreia e cólicas estomacais.
O aumento do risco de náusea e vômito provavelmente não será uma surpresa para quem já tomou esses medicamentos. O aumento do risco de cálculos renais, por outro lado, pode ser menos familiar.
“Isso pode estar relacionado à possibilidade de que as pessoas, quando estão usando GLP-1, definitivamente comem muito menos para perder peso, mas também se hidratam menos”, afirma Al-Aly em uma coletiva de imprensa. “Talvez essa desidratação crônica leve a um risco aumentado de cálculos renais”.
Os medicamentos também pareceram estar ligados a benefícios renais. Houve riscos reduzidos de que uma pessoa pudesse desenvolver doença renal crônica e infecções do trato urinário.
O estudo tem várias ressalvas importantes. Primeiro, a maioria dos pacientes cujos registros foram utilizados para o estudo eram idosos, brancos e do sexo masculino, o que é típico da população atendida pelo sistema de saúde VA.
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Em média, as pessoas no estudo tinham mais de 65 anos, mais de 70% eram brancas e mais de 92% eram homens, então os resultados do estudo podem não se aplicar a outros tipos de usuários de GLP-1.
Todos os participantes tinham diabetes, então ninguém estava tomando esses medicamentos apenas para perda de peso. Embora diabetes e obesidade apresentem muitos dos mesmos riscos para o corpo, eles não são exatamente iguais, então é difícil saber se isso também influenciou os resultados.
Por exemplo, o estudo descobriu que os usuários de GLP-1 tinham um risco 7% maior de desenvolver gastroparesia em comparação com pessoas que usavam outros tipos de medicamentos para baixar o açúcar no sangue. Mas ter diabetes também coloca uma pessoa em maior risco de desenvolver gastroparesia, então é difícil saber se os riscos seriam os mesmos para pessoas que não têm a condição.
Mas esses tipos de estudos são muito bons em gerar novas questões de pesquisa — como por que um medicamento que ajuda as pessoas a perder peso estaria associado a um risco aumentado de artrite, como este estudo mostrou?
O estudo também é observacional, o que significa que não pode provar causa e efeito. Muito frequentemente na medicina, estudos observacionais descobrem que duas coisas frequentemente acontecem ao mesmo tempo — por exemplo, países com alto consumo de chocolate produzem mais ganhadores do Prêmio Nobel per capita. Mas isso não significa que comer chocolate torna você mais inteligente.
“É quase como um mapa para estudos futuros, mas também me dá confirmação de alguns dos palpites que eu tinha, e talvez isso possa afetar algumas das minhas decisões com pacientes”, explica Melanie Jay, que estuda o tratamento e prevenção da obesidade na NYU Langone Health. Ela não esteve envolvida na pesquisa.