DA CNN
Que fique claro: eu acho que Vini Jr. merecia ganhar a Bola de Ouro e foi o melhor jogador de clube da temporada 2023-24. Também acho extremamente deselegante não comparecer para a entrega de um prêmio ao qual se concorre somente por não ter sido o premiado.
A escolha de Rodri, do Manchester City e da seleção da Espanha, como ganhador da Bola de Ouro sinaliza que o trono do futebol está vago. O esporte mais popular do planeta não tem um rei para chamar de seu.
Após a era em que Messi e Cristiano Ronaldo disputaram ano a ano as Bolas de Ouro sendo, indiscutivelmente, craques da realeza histórica, vivemos um período de vacância. Há muitos postulantes, mas nenhum com os predicados que o argentino e o português reuniam.
Acesse nosso canal de notícias no WhatsApp pelo link: FTN BRASIL
Pode-se falar de Mbappé, Haaland, Vini Jr., Lamine Yamal e do próprio Rodri. Registre-se: Rodri é um excepcional jogador de futebol, que faz jus ao termo craque. Pode não ser exuberante como Mbappé e Vini, nem é artilheiro como Haaland, mas se enquadra no rol dos ritmistas, como o croata Modric. É craque na arte do passe e da leitura de jogo.
Em outros anos, a Bola de Ouro cometeu enormes injustiças. Romário e Iniesta, por exemplo, jamais foram premiados. Mesmo sendo integrantes indiscutíveis do Olimpo do futebol.
Neymar, que sonhou obcecadamente pelo prêmio, deu azar de ser contemporâneo de Messi e Cristiano no auge de suas carreiras.
Fazer alusões de racismo ao prêmio me parece exagerado. A escolha dos 30 nomes concorrentes feita pela revista France Football deixa pouca margem a discussão, e o colégio eleitoral não parece preconceituoso. No entanto, é preciso sempre elogiar Vini por ser um justo e feroz combatente da causa antirracista no futebol e na sociedade.
Dois aspectos podem ser considerados para a escolha de Rodri.
O primeiro é bastante conhecido. A Bola de Ouro é um prêmio europeu, criado e oferecido sob a perspectiva europeia. Até os anos 1990, a premiação era oferecida somente a jogadores europeus. Este eurocentrismo talvez se reflita na lista de cem jornalistas votantes, elaborada com base nas cem primeiras posições do ranking da Fifa. Messi é argentino, mas um jogador forjado na Europa. O primeiro sul-americano a vencer o prêmio foi Ronaldo Fenômeno, em 1997. O primeiro e único africano a ser premiado foi George Weah, da Libéria, em 1995. Até hoje todos os premiados atuavam em equipes europeias (sem contar os prêmios extraordinários). Rodri foi campeão europeu com a Espanha, mesmo sem ser um destaque individual. Mas serve como bom atalho para escolha eurocêntrica.
O que pode ter pesado contra Vini foi o fato de ter disputado uma Copa América muito ruim. Prato cheio para votantes europeus justificarem a escolha por um jogador nascido no Velho Mundo, em ano de Euro.
O segundo aspecto é mais técnico e tático. Sem jogadores estelares indiscutíveis como Messi e Cristiano, ambos em fase final de carreira e atuando em ligas secundárias, a observação do futebol pode estar sendo feita de forma mais coletiva. Essa abordagem leva ao reconhecimento de jogadores como Rodri, que atuam muito mais para a equipe do que para eles próprios. O espanhol é uma peça da qual a engrenagem não pode prescindir, mesmo sem ser a mais bonita ou a mais brilhante.
Sobre a ausência da delegação do Real Madrid e de Vini Jr. da premiação, em protesto contra a escolha, é mais um capítulo da fogueira das vaidades do futebol e das picuinhas do Real Madrid, que se considera maior que o próprio esporte. Individualistas, egocêntricos, a maioria dos grandes jogadores e treinadores têm dificuldade em reconhecer méritos nos adversários e concorrentes.
Talvez a escolha de Rodri se explique por uma visão de jogo dos que votaram na Bola de Ouro. Menos individualista, mais colaborativa e escandalosamente eurocêntrica.